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Pezinhos de lã

Pezinhos de lã

O regresso aos clássicos com uma Cruz pelo meio

Este ano deambulei menos tempo pelas belas praias algarvias. Por questões de logística familiar, apenas pude usufruir de uma semana no Sul ( em maiúsculas, claro, pois é assim que me sinto quando lá estou: mais tudo!), pelo que tive pouco tempo para me dedicar ao meu exercício predileto de praia, que é a leitura.

Sempre que vou de férias, demoro mais tempo a escolher o que levar para ler do que os bikinis que vou usar. Abro o armário que alberga , há já demasiado tempo, muitos mais livros do que o recomendado, e fico ali, pasmada, a folhear, a ler a sinopse, a ler os dados biográficos do autor, o início, o fim do livro e, quando dou por mim, estão todos já na garagem, enfiados no carro à minha espera...

Este ano, e como tinha comprado alguns livros da coleção de clássicos da literatura do DN e do JN, optei por um autor que nunca tinha lido, Sir Henry Rider Haggard, com "As Minas do Rei Salomão", original traduzido ( aí foi o cúmulo do meu pasmo!) por Eça de Queiroz! 

O livro foi publicado em 1885 e, embora conhecesse a história, inclusivamente pelas versões cinematográficas, adorei-o da primeira à última página. Foi uma autêntica surpresa e, posso dizê-lo, proporcionou-me dos momentos mais hilariantes destas férias, ao ponto da minha filha me pedir para lhe ler, então, aquela parte, "Pois já que estás a fazer estas figurinhas na praia, deve ser mesmo divertido!" ( Infelizmente, não consegui incutir-lhe o meu gosto pela leitura, pelo contrário, é uma jovem "eletrónica" bastante resistente aos livros e ao papel, mas confesso que me soube bem esta pitadinha de inveja que senti nas suas palavras    )

A história gira à volta de Allan Quatermain, narrador dos acontecimentos, um caçador de elefantes e aventureiro inglês, que parte com o barão inglês, Curtis, e com o seu amigo, Capitão Good, em busca do irmão do primeiro, desaparecido no coração de África, quando procurava o famoso tesouro que dá nome ao livro. É portanto, um magnífico livro de aventuras, onde não faltam feiticeiras, animais selvagens, civilizações perdidas, esconderijos inacessíveis, desertos mortíferos, numa narrativa muitas vezes estonteante, que prende o leitor, aguçando a sua curiosidade sobre o que vai acontecer a seguir.

Ao quarto dia, tinha o livro lido. E agora?

Por sorte, tenho um familiar a viver no Algarve, leitor compulsivo, que me emprestou um dos livros da sua biblioteca, "Nem todas as baleias voam", de Afonso Cruz.  Não fiz logo a associação à famosa baleia branca, Moby Dick, claro, nem ao seu simbolismo, nem qualquer outro tipo de ligação ou reflexão a partir de um título tão inusitado. Fiquei apenas curiosa e expectante por conhecer este autor de quem nada tinha lido, até ao momento.

Na verdade, ainda não acabei este livro, o que é bastante revelador do efeito que está a  ter em mim. Os livros funcionam, um bocadinho, como as pessoas: entram na nossa vida e deixam-nos sempre algo. Muitas vezes, com sorte, trazem-nos o calor do sol, a brisa do mar suave e refrescante, as asas de uma borboleta a roçar docemente no nosso rosto. Outros, bandidos, ficam gravados na nossa pele, como ferida profunda que custa a passar.

Este é desses, dos difíceis, que nada tem a ver com as apaixonantes aventuras de Allan Quatermain e a sua busca incessante por um tesouro maravilhoso, escondido no seio da savana africana.

Neste livro, Afonso Cruz parte de um projeto desenvolvido em plena guerra fria, Jazz Embassadors, para nos mergulhar na vida da personagem principal, um músico exímio americano, Erik Gould, capaz de visualizar sons e de comunicar, através da música que toca, mensagens subliminares. Este homem do jazz, por sofrer de sinestesia, vê , vive e respira música, enquanto que o seu filho, criança com a mesma doença, vê os sentimentos dos outros, em forma de pessoas, literalmente. No centro desta dupla, encontramos a russa Natasha, amor louco de Erik e mãe do pequeno, que desaparece misteriosamente. É de música, portanto, que fala o livro, do seu poder libertador ou opressor, mas é sobretudo de política, de poder, de sofrimento, de amor, de resistência, de livros, de arte, de fé e de solidão....

Não sei se voltarei a Cruz de futuro.

Depende da profundidade das feridas que ficarem desta baleia que não voava.

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Sem IVA, por favor

Hoje fui às compras. Ao Intermarché para a carne, fruta e legumes ( isso era o que tinha em mente, mas depois comprei iogurtes, queijo e fiambre fatiado, massa quebrada, natas e queijo ralado - sim, vou fazer uma quiche- e biscoitos para a minha Kitty, que é a gata mais gira da minha rua). Depois, fui ao Lidl para o resto das compras. Aí, segui escrupulosamente a lista, sob pena de não chegarem os três sacos enormes que levava, bem como os parcos euros, na minha conta...

Ora, para compras de uma semana, uma família de quatro pessoas, abençoadas com saúde q.b e boa "boquinha", somando as compras de lista e as extra, gastei cerca de 110 euros. É verdade que o meu frigorífico ( frigoríquico, como dizia a minha filha, em pequena), que tinha ficado praticamente vazio antes de irmos de férias, ficou compostinho, e a despensa alberga agora uma quanta mercearia, todavia é impossível não se ficar abismada com o aumento dos preços. Peixe, só para uma refeição e red-fish, nada de garoupa ou robalo do mar!

Foi este "abismo" que me fez pegar no recibo da cada uma destas lojas e percorrer, um a um, cada produto comprado. Teria havido engano? Após alguns minutos, constatei que não: estava lá tudo certinho, preços, descontos e, no fim, o valor a pagar sem IVA e com IVA.

Ora, diz o Portal dos Serviços Públicos, que o IVA,  Imposto sobre Valor Acrescentado é um imposto aplicado às vendas ou prestações de serviços em Portugal, pago pelo consumidor no momento em que paga pelo bem ou serviço prestado e que o vendedor ou prestador de serviços recebe o valor do IVA  que, posteriormente, entrega à Autoridade Tributária e Aduaneira.

Ou seja, para além da inflação dos preços  (causada pelas mais variadas razões, dizem eles, embora eu duvide de muitos argumentos...) que tantas dificuldades já está a trazer às famílias portuguesas, temos que continuar a pagar um imposto ao Estado, sobre aquilo que comemos! Saudável ou não, há uma taxa para tudo, 6, 13 ou 23%,  sem IVA nada passa...  E hoje, sem IVA, eu teria poupado cerca de 15 euros nas minhas compras...

Já agora, ignorava que os produtos de limpeza e higiene, incluindo o papel higiénico e os guardanapos fossem taxados a 23%. O que nos diz isto, que manter a casa limpa é um luxo? E quem é que não compra enlatados: cogumelos, feijão, polpa de tomate ou congelados: croquetes, rissóis ou pastéis de bacalhau? Pois é, também a 23%... e nada de comprar beterraba cozida, ervas aromáticas ou sobremesas Paturette, pois a taxa é a mesma...

Diz o nosso povo que é rir para não chorar...

É isso e o olhar doce da minha Kitty que tem de continuar a comer, apesar do preço dos seus biscoitinhos, com IVA a 23% ...

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